De janeiro a dezembro, sem trégua, nas horas mais impróprias e invasivas, vozes preparadas oferecem, ao telefone, tentadores cartões de crédito. Em outubro, começam as ofertas de “Compre agora e comece a pagar em fevereiro”. Alvoroçados, homens e mulheres de todas as idades se atiram às compras, satisfazendo sonhos de últimos modelos de celulares, notebooks, bicicletas e bonecas cheias de acessórios. Em março, sem falhar, o assunto é a inadimplência, junto com o desgosto de quem já enjoou do produto que ainda levará bom tempo para pagar.
Ofertas tentadoras fazem o consumidor esquecer a sua real capacidade de compra. Simples assim: comprou, tem que pagar. O vendedor, por seu lado, na pressa de efetuar o negócio, prefere ignorar a evidência de que o sujeito jamais poderá honrar o seu compromisso. Oferece guloseimas ao diabético, sem medir as conseqüências.
Da mesma forma, ao assumir novos cartões, as pessoas parecem ignorar o fato de que o acesso a mais crédito, para alguns, é certeza de confusão. Enquanto, aos cautelosos, a posse de um cartão representa a segurança, caso surja um problema inesperado, outros passam a acreditar que o seu poder de compra aumentou. Acumulam cartões, com a alegria de quem houvesse recebido aumento no salário. Para realizar qualquer desejo, entram no negativo, com a placidez de quem nunca precisasse saldar a dívida, aumentada pelos juros bancários.
Pessoas comuns, carentes de recursos e cheias de sonhos, entram nessa espiral financeira, contando com ajuda divina ou acerto na loteria. Aí vem a hora em que vencem os carnês, estouram os cartões e o sujeito se encontra com a realidade. Começa o pesadelo.
Nos Estados Unidos, gente sem a menor condição financeira tinha acesso a investimentos imobiliários, adquiridos um após outro, tendo como garantia o imóvel que ainda não estava pago. No mesmo ritmo, enquanto alardeavam ganhos milionários, grandes empresas sobreviviam à base de financiamentos, inclusive para efetuar o pagamento mensal dos funcionários. Em algum momento, a bolha ia estourar.
De repente, o mundo descobriu que vivia numa economia virtual. Na falta de assunto mais empolgante, os noticiários diários se encarregaram de criar e manter o estado de tensão.
A crise mundial vem num crescendo, ameaçando soterrar a todos na histeria coletiva. O primeiro gritou “Fogo” e todos vão morrer pisoteados, se não pularem rápido pro lado, esperando a situação acalmar.
Segundo os entendidos, os efeitos desastrosos chegarão ao Brasil em 2009. Se o pânico não acelerar o processo, talvez haja tempo para puxar o freio do consumismo e encontrar a melhor maneira de resistir ao impacto.
Com dinheiro escasso, sobrarão estoques por todo lado, sem importar a alta qualidade do que se tiver a oferecer. Pela insensatez e ganância de muitos, outros tantos perderão seus empregos ou se verão em sérias dificuldades. No entanto, essa crise _ não se precisa entender de economia para compreender _ não precisaria ter acontecido.
Ou talvez precisasse, para aprendermos a lição básica de que não se pode dar o passo maior que a perna.
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