Às voltas com presentes, decoração natalina, preparação da ceia, chegada dos hóspedes habituais, temos a sensação de que o tempo passou rápido demais. Exaustos, não conseguimos realizar tudo o que desejaríamos. Invadidos por sentimentos contraditórios, num breve momento de depressão, assalta-nos o desejo de que tudo passe logo, para voltarmos à nossa rotina, aquela mesma que muitas vezes nos aborreceu.
Em meio a papéis coloridos, laços vermelhos, perguntas de “Cadê o durex?” e “Coloco o presépio dentro da lareira ou sobre a mesa redonda?”, o espírito de Natal chega de mansinho, cobrindo o ambiente de paz e união.
Súbito, a escolha de cada presente deixa de ser obrigação e se transforma num gesto de carinho; as mãos elaboram com calma os pacotes, para não perturbar o fluxo das recordações. Enquanto isso, a criança alcança o anjo de asas tortas, que ela lembra um dia ter ajudado a avó a colocar naquele galho verde.
E o pensamento, arteiro, inventa brincadeiras para o “Amigo Secreto”; depois, foge para outros Natais. Lá se distrai, ora na descoberta dos presentes sob a cama, em alegres manhãs, ora nas reuniões da família, os jantares festivos programados, os três perus trazidos com antecedência da estância, a algazarra que faziam no pátio, presos no galinheiro, aos cuidados do velho cão Bilú. O cão a correr de um lado a outro do fio de arame estendido, os da casa a ignorar seus constantes latidos. Após, a costumeira visita dos larápios, atraídos pelo estardalhaço dos insistentes gluglus; imbuídos do espírito natalino, sempre um eles deixavam. Esse - grande, peito estufado, assado e bem dourado - enfeitava a mesa a que chegavam cada vez mais familiares e amigos, para alegria e desespero de mamãe, a anfitriã. Completamente inocentes, os convivas colocavam fartas e brancas fatias nos pratos de porcelana rosa, entremeadas com colheradas de sarrabulho e purê de maçã, enquanto os da casa, com a recomendação de se servirem por último, aguardavam, discretos.
No final, o milagre da multiplicação mais uma vez acontecia e todos suspiravam, aliviados.
Tantos Natais assim passaram, numa constante renovação, falando do Menino que nasceu na manjedoura e veio ao mundo para nos salvar, lembrando que ELE ainda caminha pelas ruas e, paciente, espera que o enxerguemos. Ensinando-nos, através de lições várias, que, se repartirmos o tanto que temos, o pouco que sobra se multiplicará. Dizendo-nos, também, que este não é um tempo para irritações e compromissos forçados, mas hora de reunir a família e os amigos e comemorar, da melhor forma possível, a alegria de estarmos juntos.
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