3 de mar. de 2004

Além do preconceito

Há diferentes formas de discriminação. Algumas são inócuas e até engraçadas; outras, cruéis, podem deixar marcas para o resto da vida.

Cômico foi o comportamento de uma atendente de sofisticada loja, em HongKong, relatado por uma turista. Como essa estivesse muito interessada em determinado colar de turquesas, perguntou à balconista qual seria o preço do mesmo. Para seu espanto, a outra respondeu:
_ A senhora não vai ter dinheiro para comprar – sem se dignar a dizer o preço.

Bem-humorada, quando nos contou o fato, às risadas, a turista completou:
_ Preciso me vestir melhor.

No entanto, ela estava bem vestida, dentro dos padrões brasileiros. Ocorre que, para muitos asiáticos, nós, ocidentais, somos seres inferiores. Não possuímos a sua cultura milenar, como os guias turísticos locais não cansam de lembrar.

A narrativa de tal fato logo suscitou outras lembranças e cada um tinha uma história semelhante para contar. Contudo, em qualquer dos casos, ainda que a pessoa se aborreça pela desconsideração, no fundo ela sabe que o outro deve ser um ignorante, para agir dessa maneira, prejudicando o seu negócio ou o seu emprego.

Sem justificativas são outros tipos de discriminação, principalmente quando se referem à cor da pele, sexo ou condição social.

Chocante - por evidenciar o quanto o preconceito racial permanece forte em nossa sociedade – foi o ocorrido com os jovens William e Cristian Silveira, interpelados por policiais da Brigada Militar, em Porto Alegre, quando corriam para não perder o horário de entrada para a realização das provas do vestibular de Engenharia. A discriminação foi caracterizada pelo fato de vários jovens estarem correndo e somente os dois, negros, terem sido abordados pelos policiais, como se fossem marginais.

Embora os colegas e outras pessoas tenham intercedido a seu favor, a demora na liberação ocasionou a perda do horário de entrada, prejudicando os jovens. Seus pais levaram o assunto adiante, com toda a razão, chamando a atenção da mídia e nos conscientizando que falta muito para sermos de fato civilizados e iguais.

Qualquer manifestação de preconceito é motivo de vergonha para todos nós. Por isso, não deixemos a defesa dos negros só aos negros, a dos gays também só aos gays. Sintamo-nos ofendidos e saibamos reagir, quando qualquer pessoa sofrer discriminação junto a nós.

Por outro lado, se, tal como no caso citado, cada um tiver consciência do seu valor, discriminações passarão a simbolizar apenas ignorância e atraso.
Em lugar de alguém se ofender por ser chamado de negro, deveria responder:
_ Negro, sim, e com o maior orgulho.

Como ensinam às filhas as mulheres brasileiras que vi na Suíça, presenteando-as com lindas bonecas negras, orgulhosas de sua raça.

Há um longo caminho a ser percorrido para longe do preconceito e ele começa na aceitação da nossa condição e no orgulho e prazer de sermos nós mesmos.

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