Encontro, com freqüência, pessoas tolhidas por seus receios: medo de atravessar uma sala sozinha, de experimentar um novo corte de cabelo, de incomodar, de dizer “não”, de morar sozinha, de trocar de emprego, de virar a mesa e recomeçar. Em contrapartida, outras, às vezes menos qualificadas, têm seu nome projetado e galgam postos, por acreditarem em si e assumirem riscos.
Na maioria das vezes, esse processo começa na infância. A criança é alertada para se proteger dos perigos: ter cuidado no contato com estranhos, com os palitos de fósforo, ao atravessar a rua. São tantos os males deste mundo, logo ela percebe. Ainda muito pequena, aprende a conhecer os sinais: acostuma-se a temer um olhar enérgico, um franzir de sobrancelhas, o nervoso bater do lápis sobre o tampo da escrivaninha. Na tentativa de agradar, ela se retrai, encolhe, quase desaparece.
Depois, adulta, maneja diferentes solicitações. Agora, o mundo exige que seja afoita, destemida, confiante. Para vencer, lhe dizem, necessita arrojo. O que fazer com os medos cultivados, com a bagagem de insegurança, temor ao desconhecido, responsáveis pelas unhas roídas e a necessidade da luz acesa para dormir?
Contudo, convicta da importância da nova imagem, ela relega ao fundo do armário todos os bichinhos de pelúcia e, dentro da caixa forrada de tecido azul, também guarda a coleção de papéis de carta coloridos. Necessita muito mais, ela sabe: uma mudança interior, uma tomada de posição, talvez um enfrentamento. Com a mãe opressora, ou cheia de boas intenções, cujo amor tolhe, ao invés de libertar? Com o pai e sua insistência em mostrar o caminho? Com todos os que a pressionam com as suas expectativas? Ou apenas consigo mesma, para se perceber como gente?
Se eu pudesse, gostaria de colocar todos os meus medos numa prateleira. Ficaria olhando de frente para cada um deles, procurando entender a sua origem e as conseqüências em minha vida. Medo de falhar, mostrar fraqueza ou ignorância? Medo de perder alguém, ficar sozinha e precisar enfrentar o mundo? Medo de ser considerada chata, retrógrada e obsoleta? Medo de avião, elevador, altura? Quantos medos crescem, incentivados pela insegurança?
É provável que, sobre essa prateleira fictícia, eu visse cada um deles diminuir até desaparecer, como acontece aos extraterrestres nos filmes de ficção, quando o mocinho descobre a fórmula capaz de destruí-los. O medo aniquila e nos torna reféns, dissecá-lo é o primeiro passo para a vitória.
É muito bom quando começamos a conhecer as nossas motivações e receios, apesar de ser trabalhosa essa busca, tão acostumados estamos a nos esconder atrás das opiniões alheias. E dá uma vontade louca de sair sacudindo as pessoas por aí, para que cada uma compreenda todo o seu potencial e pinte, cante, grite todas as coisas que a gratificam e em que acredita.
Compete a cada um a resolução dos seus dilemas, muito pouco os outros podem ajudar. Mas bem que eu gostaria de possuir essa varinha de condão capaz de atingir o íntimo dos tímidos, revolver todos os medos, substituindo os “eu não posso” por “vou tentar”, transformando cada retroceder em avançar. Se eu fosse uma fada, haveria muito serviço. E começaria por mim, que também mereço.
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