28 de jan. de 2005

Quem vai para o paredão?

Mais de vinte milhões de votos os telespectadores enviaram, por telefone ou pela internet, no último Big Brother. É um enorme contingente humano, mobilizado pelo poder da televisão.

Posicionaram-se para decidir os rumos da educação? Resolver se a língua inglesa deve ser abolida do exame para admissão ao Itamaraty? Colocar na pauta da discussão a cota para negros nas universidades ou o Estatuto do Desarmamento? Transmitir a opinião dos telespectadores sobre o aumento do salário dos deputados federais?

Nada disso. Domingo à noite, o povo prefere temas leves, por isso se preocupou com a escolha de quem devia ir para o paredão, a fim de mais tarde proporcionar ao seu preferido a oportunidade ímpar de receber um milhão de reais, pela capacidade demonstrada de resistir às fofocas e intrigas, durante semanas em que só se ocuparam com isso.

Talvez a minha surpresa seja resultado da falta de informação, pois só assisti ao primeiro Big Brother, esse do princípio ao fim, sempre à espera de um lance diferente, alguma discussão interessante, pelo menos uma frase completa. Como nada disso ocorreu, confessei-me vencida e preferi voltar à leitura do livro ou aos jornais. Nunca mais consegui me fixar na telinha, quando aquele grupo de jovens cada vez mais lindos e sarados se esforça em mostrar a sua total falta de idéias. Que pode não ser tão absoluta como eles desejam demonstrar; quem sabe fazem tipo, sabendo que é o esperado deles?

Mas, essa capacidade de mobilização demonstrada pela TV apresenta pontos positivos. O maior deles é que a mídia pode ensinar a todos nós, exacerbados individualistas, a nos preocuparmos com questões além dos nossos interesses, fazendo-nos unir forças para defender as nossas crenças.

Se foram mais de vinte milhões de votos, outros milhões decerto só assistiram, sem se manifestar. Então, a pergunta é: quantas pessoas estariam com a TV ligada no Big Brother, naquele domingo? E a seguinte: qual seria o impacto da mobilização dessa multidão, se ela decidisse manifestar a sua opinião sobre cada um daqueles assuntos que nos fazem às vezes dizer que esse país não tem jeito?

Na mesma página do jornal em que li o estarrecedor número de participantes, também li uma notícia de cinqüenta anos atrás sobre o protesto de um estudante de então. Para impedir a derrubada de uma árvore antiga no pátio da Faculdade de Direito da UFRGS, ele subiu na árvore, seguido por mais dois estudantes; logo eram cem pessoas e depois mil, que se colocaram entre a árvore e os funcionários com ordem para cortá-la. A reportagem não conta o desfecho da história, nem vai ao mérito da questão e à necessidade ou não de cortar a tal árvore. Importa é o exemplo, que nos fala do poder da mobilização. Esse poder que precisamos aprender a usar com urgência, em defesa das nossas idéias.

Ou podemos deixar tudo como está e nós mesmos participarmos da votação, escolhendo quais crenças devem ser colocadas primeiro no paredão para serem logo eliminadas.

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