Sei lá que revolução a mudança no calendário realiza dentro das cabeças, mas a verdade é que um novo ano sempre mexe com as emoções. Ao contrário do ano que finda, cheio do ranço das situações mal-resolvidas, o ano que começa vem carregado de expectativas, repleto de esperança.
O final do outro nos deixou meio pra baixo. Na avaliação inevitável, colocadas as coisas na balança – relacionamentos, perdas, vida profissional, qualidade de vida, situação financeira - talvez a conclusão não tenha sido a mais favorável, por isso aquele abatimento de última hora.
Passada a noite festiva, em que o incômodo – como alguém identificou – é “a obrigação de ser feliz”, a vida entra nos eixos. Mas, nessa passagem, não há como negar, algo acontece dentro de nós. De repente, a gente se percebe arrumando gavetas, descartando coisas, fazendo planos, num assomo de renovação. No clima de euforia, atitudes são cobradas. Pegos de surpresa, alguns fazem promessas difíceis de cumprir, enquanto outros, ao contrário, sequer percebem onde erraram. Desses, a maioria perde tempo e fôlego, arranjando culpados e desculpas para as suas frustrações.
Embora, em geral, costumemos nos portar de forma dispersiva, acumulando projetos e idéias, grande parte sem condições de se transformar em realidade, pela costumeira falta de coerência. Enquanto fingimos batalhar pela realização de algum sonho, nós mesmos tratamos de impossibilitá-lo, criando obstáculos. Como alguém que deseja adquirir um bem maior e dispersa o seu salário na compra de eletrodomésticos mais modernos e sofisticados. Ou como a mulher que nunca junta o suficiente para a viagem sonhada, mas não resiste à compra de uma jóia. Como o casal que jura apostar tudo no futuro do filho, mas não se preocupa com a escolha do colégio. Como o jovem que sonha com muito prestígio e boa situação financeira, mas se candidata ao curso mais desprestigiado, porque nesse o vestibular é pouco concorrido.
Dispersivos, nem percebemos a mudança de rota, quando enveredamos por um caminho que nos distancia do nosso objetivo. Outras vezes, por comodismo, simplesmente nos deixamos ficar em lugares ou situações que não tínhamos idéia de perpetuar. Tal como o emprego que alguém assume, enquanto não completa os estudos ou está à espera da chamada para outro, certas situações servem apenas por determinado período. Se o sujeito se acomoda e deixa o tempo passar, as oportunidades também passam. Quando se dá conta, é tarde demais para mudar.
Engraçado, precisar de planejamento até para ser feliz. Mas, sem um projeto de vida, a tendência é que nos tornemos dispersivos, perdendo-nos nos labirintos do consumismo ou das armadilhas criadas por nós mesmos, mais empenhados em provar a impossibilidade do que em vencer as barreiras.
Projeto de vida é sinônimo de “sonho maior”, aquele que, irrealizado, será responsável pela frustração e infelicidade. Projeto de vida, portanto, é coisa séria; não dá pra brincar com ele.
Início de ano é tempo propício para revisão do projeto de vida. E, na falta de algum, que simplesmente escolhamos a fidelidade a nós mesmos.
2 comentários:
Marta!
Quando começa o Novo Ano, meu projeto de vida é quase sempre o mesmo ou seja, pedir, humildemente a Deus, que me dê saúde, para que possa cumprir minhas metas.
Beijos da Ruthe
Um novo ano sempre mexe com as emoções. E como está a mexer com as minhas emoções!
Rever o que fiz ontem e viver o hoje é a minha grande motivação, aprender dos erros e evitar a dispersão.
Reflito muito nas palavras de Fernando Pessoa:
"Não importa se a estação do ano muda, se o século vira, conserva a vontade de viver, não se chega a parte alguma sem ela."
Valeu o artigo. É de salientar que gosto de ler suas crónicas no semanário Folha 8. De quando em vez publico no espaço poético do mesmo semanário alguns dos meus poemas.
Um abraço
Nguimba Ngola
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