23 de ago. de 2008

Espírito olímpico

Foi grandiosa a cerimônia de abertura dos XXIX Jogos Olímpicos, realizada na cidade chinesa de Beijin, (Pequim), em 8/8/2008. A China se programou com esmero para deixar o mundo ocidental de queixo caído. Em 2006, quando visitei Pequim, a cidade estava transformada num parque de construções, enormes edifícios sendo erguidos às pressas. Andaimes de bambus prometiam hotéis e shopping centers, por todo lado.
Considerada excepcional e surpreendente, a cerimônia de abertura foi presenciada por 91 mil pessoas, no estádio Ninho de Pássaro, e assistida por quatro bilhões de telespectadores em todo o mundo.

Poucos dias após, ainda sob o efeito da magia, verdade bem pouco glamorosa começou a ser desvendada, proporcionando o sentimento de manipulação programada.

Aos poucos, descobriu-se que a voz que entoou a “Ode à Pátria” não pertencia à encantadora menina (chamada pela imprensa chinesa de “estrela em ascensão”) que a interpretou, na verdade em “playback”. Porque a verdadeira cantora era outra menina, de figura pouco atraente, acima do peso, com dentes feios. Como não representaria à altura a imagem que a China desejava mostrar ao mundo, foi descartada.

Questionadas, as autoridades admitiram a troca, dizendo ser “uma questão de interesse nacional”. A decisão de substituir a cantora em frente às câmeras foi tomada durante um ensaio, assistido por um dos principais dirigentes do Partido Comunista Chinês.

Como se isso fosse pouco, também veio à tona a informação de que algumas imagens dos fogos de artifício transmitidas na TV, embasbacando a todos, na verdade haviam sido gravadas com antecedência e editadas. Numa cena espetacular, anéis gigantescos com fogos cruzados surgiram no céu, supostamente filmados ao vivo de um helicóptero. Como a poluição chinesa impediria a visão, as imagens foram editadas, com grande tecnologia.

Aí lembrei um campeiro, homem rústico, que nunca acreditou que o homem tivesse ido à lua, embora houvesse presenciado o fato na TV, junto conosco. Descrença então considerada absurda, hoje teria razão de ser.

Mas os questionamentos não cessam nesse ponto. Também a idade de duas das seis ginastas da Seleção da China que conquistaram medalha de ouro está sendo posta em dúvida. Há sérias interrogações sobre a idoneidade dos documentos comprobatórios da idade das ginastas. A idade mínima permitida é 16 anos, feitos durante o ano da Olimpíada, pois, quanto mais jovem a ginasta, maior a flexibilidade. Reportagens anteriores, referindo-se à idade das ginastas como 14 anos, segundo consta, foram retiradas dos sites estatais.

Talvez o mais surpreendente, nisso tudo, seja a naturalidade com que autoridades tratam do assunto, empenhadas em criar uma imagem ideal de uma China fictícia. Como se, para elas, importasse mais a fantasia que a realidade, a moldura que o quadro.
Ou talvez seja compreensível que, após longo período de lavagem cerebral, nem todos os chineses possam compreender o sentido do espírito olímpico, demonstrado com bravura por muitos atletas, inclusive seus.

Na China, como no Brasil ou em qualquer outro país, há pessoas boas e pessoas más, pessoas idôneas e pessoas capazes de inverter verdades e nos convencer do que desejarem. Olhos abertos, ouvidos atentos e capacidade de questionar só fazem bem.

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