Diante de grandes tragédias, costumam surgir soluções simplistas. Algumas, no primeiro momento, principalmente por nos encontrarem fragilizados, parecem coerentes. Mas idéias são perigosas, quando tomam corpo, aproveitando momentos de perplexidade e dor. Repetidas muitas vezes por formadores de opinião (que nem por isso são donos da verdade), constantemente absorvidas nos jornais ou em programas de entrevistas, simples teses assumem ares de verdade incontestável, pelo martelar contínuo.
O horror da tragédia ocorrida no bairro Realengo, no Rio de Janeiro _ quando um rapaz perturbado mentalmente entrou numa escola municipal, fazendo-se passar por palestrante, e descarregou várias vezes o seu revolver em crianças indefesas, matando várias, antes de se suicidar _ despertou esse tipo de solução simplista.
É chocante admitir que um desequilibrado pode arquitetar uma chacina e realizá-la, em qualquer local, driblando toda a segurança. Cada pai e mãe desse país se coloca na situação daqueles que perderam seus filhos e se enche de medo que a tragédia se repita. Acreditar que uma campanha de desarmamento seja a solução contra a violência desenfreada é encontrar um consolo, em meio à dor e ao desamparo. Porque, de repente, descobrimos que somos reféns da violência. A qualquer momento, ela pode explodir. Ninguém está imune, seguro, protegido. Diante da verdade que não se suporta assimilar, decide-se o óbvio: “retirar todas as armas da população, para isso nunca mais acontecer”.
Mas a verdade é que as pessoas bem-intencionadas entregam suas armas e os bandidos as conservam. E o jovem atirador não possuía porte nem registro da arma, como a lei exige dos cidadãos; a arma que ele utilizou era ilegal, comprada de alguém que não se questionou sobre as razões que levariam um jovem a desejar adquirir um revólver e bastante munição. Quer dizer, esse tipo de situação poderia acontecer _ para nossa dor _ mesmo se efetuado o mais eficiente desarmamento.
Aliás, nada contra uma campanha de desarmamento em que o bom-senso seja a arma utilizada. Campanha em que os cidadãos, espontaneamente, entreguem suas armas. Inclusive, a maioria fora de uso, arcaicas, como aconteceu na campanha anterior. Tudo contra qualquer projeto de lei que impeça o cidadão honesto de adquirir legalmente uma arma, se julgar necessário. Tudo contra o alto preço do registro e do porte de arma, retirando ao pai de família assalariado o direito de defender sua família e os bens adquiridos com esforço.
Contudo, o tema “desarmamento” é complexo demais para ser utilizado como solução para problemas que não sabemos como enfrentar. Porque pessoas idôneas, inclusive submetidas a teste psicológico _ como ocorre dentro da nossa legislação _ devem ter o direito, numa democracia, de escolher se desejam ou não ter uma arma para defesa pessoal e familiar. Porque alguns cidadãos urbanos podem acreditar que, em caso de necessidade, chamando o 190, logo serão socorridos, mas o homem do campo, sozinho em sua propriedade, a muitos quilômetros de qualquer delegacia, sabe que conta apenas com ele mesmo. Por isso, a decisão compete a cada um.
Mas, se as autoridades constituídas, como medida de prevenção, julgarem que a solução para a violência é desarmar toda a população, retirando o direito de defesa, a população poderia exigir, em contrapartida, que todas as autoridades renunciassem à proteção dos seguranças armados com que contam, pagos com o dinheiro dos contribuintes que alguns pretendem desarmar. Em igualdade de condições, seria mais fácil acreditar na coerência das idéias.
Um comentário:
Este artigo está perfeito do começo ao fim!É aquela história:"Faz oque eu digo, mas não faz o que eu faço."
Estava com saudades. Que ótimo que tudo voltou ao que era antes.
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