7 de jun. de 2011

Enquanto isso não acontece

Estudei em colégio público. No Colégio Municipal Pelotense, para ser mais explícita, ainda no prédio velho. Na época, ícone em educação. Foi ótima a escolha de meus pais. Lá, além dos excelentes professores, convivi com colegas do sexo feminino e masculino, de diferentes classes sociais, em igualdade de condições, propiciada pelo uso do uniforme obrigatório.

Interessante que, apesar de o grupo de amigas estudar no Colégio São José, particular, sentia-me maravilhosamente bem no Gato Pelado. Até achava graça quando os colegas _ aproveitando que o outro educandário, só feminino, encerrava as aulas quinze minutos após _ saíam adoidados para esperar a outra saída, desinteressados de nós, com quem conviviam normalmente.

Assim, o convívio natural entre os dois sexos, quando a maioria das escolas particulares fazia essa distinção, foi outro benefício do ensino público, além do alto nível dos professores, da disciplina rígida e da convivência com colegas de diferentes níveis sociais. Naquele ambiente eclético, qualquer tipo de discriminação seria impensado, embora diferenças houvesse, alguns destacados pelas notas sempre altas, outros pela freqüência ao Conselho, em virtude do mau comportamento, observado pelo Sêo Elias, o inspetor de disciplina. Nessas ocasiões _ contavam os transgressores _ a pena imposta era uma enorme conta de dividir, capaz de levar horas de cálculos, em que a maior dúvida era se o Sêo Elias saberia o resultado. Os castigados achavam impossível, tal o tamanho da operação, que ocupava as duas páginas do caderno aberto.

Mais tarde, os filhos também freqüentaram colégios públicos. Inicialmente, o Colégio Estadual Pedro Osório, depois também o Pelotense, colégio do coração dos seus pais. Nessa época, o educandário já sofrera grandes transformações, em virtude da dificuldade de verbas públicas. Na primeira greve dos professores, sem data para terminar, ambos pediram para ser transferidos para um colégio particular, onde estavam os seus amigos. Lá, surpreendeu a formação de grupinhos, segregados os colegas com menos dinheiro ou prestígio social.

Com o passar do tempo, o ensino público ficou cada vez mais desprestigiado, tanto pelos baixos salários dos professores como pela precária manutenção das escolas e do material pedagógico. Em conseqüência, pais e mães apertam o cinto para manter os filhos em escolas particulares, sabedores de que esse esforço, se bem utilizado por eles, será recompensado com uma melhor qualificação profissional, no futuro. Aumenta o fosso entre os que podem freqüentar escolas de elite e entre aqueles “beneficiados” com bolsas protecionistas, quando poderiam ter acesso pelo seu próprio mérito, se respeitados os seus direitos.

Diante dessa realidade, sobram as perguntas: há pior discriminação que limitar as oportunidades oferecidas a crianças e jovens de baixo poder aquisitivo, penalizando a maior parte da população com uma educação precária, por não ter condições de pagar uma escola particular? Não seria mais lógico o Estado prestigiar as escolas públicas, propiciando o convívio saudável entre crianças e jovens de todas as situações sociais, na aceitação e certeza de todos iguais, respeitadas as diferenças?

Só que, para que isso aconteça, é preciso que o Estado faça o dever de casa, proporcionando àquelas condições para se equipararem às particulares. Enquanto isso não acontecer, não venham as autoridades nos falar em discriminação. Nem afirmar que, pela constituição, todos são iguais.

Um comentário:

Ruthe N. Peters disse...

Muito triste esta situação, que todos depreciamos. Preciso acreditar, de que alguma autoridade, irá por um fim a esta segregação!

Beijos