Quem
sai de Pelotas, RS, e, no trevo da BR116, toma o rumo de Porto Alegre ou, ao
contrário, segue para Pedro Osório e Jaguarão, encontra estrada sempre plana, campos
semeados com soja e arroz, criação de gado. Se, no trevo, escolher a direção de
Morro Redondo, Canguçu e Santana da Boa vista, encontrará uma paisagem ímpar, a
estrada sinuosa, margeada por belas árvores.
Pouco
adiante, está Canguçu, terra de povo trabalhador e gentil. A cidade é feita de
altos e baixos; ciclistas não se arriscam pelas ruas cheias de subidas e
descidas e até as motos são escassas, na tarde de verão. Lá, as pessoas ainda
param para conversar, ao encontrar algum amigo ou conhecido, e são vários os grupos
de dois ou três, interrompendo o fluxo do trânsito, sem perturbar ou serem
perturbados.
O
sol é forte. À porta da Sorveteria Arndt, mulheres e crianças esperam para saborear
o sorvete de casquinha. Consigo a única mesa desocupada e peço um Milk Shake, na
intenção de escapar da fila do sorvete. Na mesa ao lado, o menino divide a
atenção entre um enorme pastel e a coca-cola, com a expressão feliz de guri que
aproveita o passeio com o pai para saciar todas as vontades.
Caminho
ao longo da rua principal, observando o nível dos estabelecimentos comerciais,
sinal de que o potencial dos consumidores é reconhecido. Canguçu possui filial
da Casa Hercílio, Sulpar, Lojas Colombo, Farmácias Tchê e Popular, percebo, num
rápido olhar. É berço da Yara Decorações, com excelentes filiais em Pelotas.
Entro
na Agro-comercial Afubra e não resisto a algumas compras. No caixa, descubro: a
Afubra possui banheiro! E não daqueles interditados, com a corriqueira alegação
de “faltou água”, como acontece em certas lojas do free-shop de Rio Branco, por
exemplo, em total desconsideração aos consumidores. Ou “só para os
funcionários”, como em algumas de Pelotas e de outros locais. Ou bagunçado e
com aparelhos de segunda categoria. O banheiro feminino é bonito, moderno,
asseado. Há também o masculino, naturalmente, e o para portadores de necessidades
especiais. Ponto para Canguçu, que sabe pensar grande.
O
movimento intenso de automóveis, caminhonetes e transeuntes dá idéia de cidade
pujante e povo trabalhador. Canguçu, com mais de 53.000 habitantes, é considerado
o município brasileiro com maior número de minifúndios, cerca de 14.000
propriedades rurais.
A
jovem amiga, advogada, com escritório em Canguçu, só tem elogios para a gente
do lugar, sempre orgulhosa da capacidade de honrar seus compromissos. Moradores
de grandes centros podem ficar surpresos com a opção de morar e trabalhar em
uma cidade de porte menor. Mas hoje, quando se usufrui das notícias globais a
um clique na internet, junto com a facilidade cada vez maior de viajar para
todos os cantos do mundo, há quem prefira incrementar essas circunstâncias com
o prazer da convivência e o calor humano, ainda encontrado nas cidades menores.
E
não se engane quem vir algum cidadão local, na fila do Banco do Brasil, com
chinelos de borracha e mãos calejadas pelo trabalho manual. É bem possível que
ele tenha mais dinheiro na conta do que quem se atém a juízos apressados. Aliás,
a aparência despretensiosa tem proporcionado perda de boas vendas a alguns proprietários
de concessionárias de automóveis, incapazes de perceber além das aparências. E
os moradores da cidade se divertem, comprando em outro local, onde são
bem-vindos, mas voltando para a primeira revisão justamente onde foram
esnobados.
Retorno
ao automóvel, estacionado em frente à Lynitron, onde o marido permanece, sabendo
as últimas novidades do Elmo, enquanto acompanha o conserto do telefone rural. A
gente anda por aí e enche a boca pra falar de tudo que viu; ignora a beleza próxima,
aquela escondida na luta de todos os dias, no trabalho que rende frutos e torna
um povo orgulhoso de ser como é.
Prazer, Canguçu: gostei de te rever. Não sei
se mudaste, desde a última visita, ou se eu é que adquiri olhos para te
enxergar.
Um comentário:
Dá gosto visitar ou morar numa cidade tão ordeira e preocupada com o povo e seus visitantes. Parabéns aos Dirigentes de Canguçu!
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