Em crônica anterior, comentei o comportamento de alguns pais, quando levam os filhos a restaurantes; aquela situação de deixarem os pimpolhos à vontade, inclusive para gritar e correr entre as mesas. Discordar da opinião alheia é direito de cada um; perturbar o sossego dos outros é falta de educação, embora muitas vezes a gente nem se dê conta da inconveniência, encantados que estamos com nossos rebentos.
Por isso, de vez em quando, um puxão de orelha vem bem. Aconteceu comigo, quando o filho caçula, com 6 anos, foi operado de apendicite. Apesar de tudo ter corrido muito bem e de o menino ter se mostrado muito valente, sem fazer fiasco nem para tomar injeção, é fácil imaginar o aperto no coração dos jovens pais, enfrentando pela primeira vez a situação de um filho hospitalizado.
Naquela época, a educação obedecia a mais regras que as atualmente impostas. Crianças tinham horários restritos para assistir à TV, estendidos aos sábados, somente; iam pra cama às oito da noite, para os pais terem um pouco de sossego; refrigerantes eram regalias reservadas aos domingos; balas e guloseimas eram limitadas, da mesma forma. Sem falar nas regras de convívio, como cumprimentar todos os adultos, ao chegar ou sair de algum lugar; serem servidas depois dos mais velhos; não interferirem na conversação.
As regras funcionavam muito bem, no dia a dia. Até o jovem casal ser desestabilizado pela situação do filho hospitalizado, após vários dias de sofrimento intenso, sem o diagnóstico adequado. Naquele momento, vencida a primeira etapa, o menino operado com sucesso, mas obrigado ao repouso hospitalar, caíram as defesas educativas, substituídas pelo alívio e pelo desejo de tudo compensar.
Pois o sonho de consumo do menino era uma super dose de TV, assistir aos desenhos preferidos, sem horário ou limitações. Providenciada a TV _ naquela época, como os hospitais não costumavam fornecê-la, trazia-se de casa a portátil _ o menino se regalou, passando de um programa a outro, feliz por estar no hospital, lugar maravilhoso onde tal situação era permitida.
Até que, certo dia, chegou o médico e o menino, naturalmente, seguiu de olhos pregados no filme. O médico falava com ele, fazia perguntas, e eu, a mãe, respondia, sem perceber a desconsideração. Até que o médico, bom educador, teve a iniciativa de desligar a TV, colocando tudo nos eixos.
Quase morri de vergonha, óbvio, mas caí na real: tudo tem seu limite, principalmente porque as crianças são mestras em perceber as fraquezas e se aproveitarem delas. Dá-se um dedinho, consente-se algo e elas logo descobrem maneiras de conseguir mais. Algumas gritam e esperneiam, tentando vencer pelo cansaço e pelo constrangimento; outras, mais espertas e manipuladoras, vencem qualquer resistência com carinhos e vozes meigas. É preciso se investir de muita fortaleza, para fornecer os limites norteadores, principalmente porque eles serão mais contestados, na adolescência, quando para alguns pais a batalha já estará perdida.
Os pais sofrem mais que os filhos, quando obrigados a impor regras que acreditam garantir a segurança (não presentear a motocicleta sonhada, por saber do alto índice de acidentes; negar a chave do carro, enquanto não tiver a carteira; não permitir bebidas alcoólicas, na festa dos quinze anos, e muitas outras), mas são agradavelmente surpreendidos, quando os filhos crescem e, cidadãos conscientes, lhes dão razão. Consentir é fácil, pena que tem seu preço; educar é doloroso, mas o tempo dirá que valeu a pena.
4 comentários:
Tomara que o teu puxão de orelhas sirva para muita gente, porque está demais...Saudades.
"Marta querida!Leio sempre tuas crônicas e muito as admiro. Sinto nelas uma realidade e sensibilidade que chegam a comover-me.Beijos"
Impor regras é muito importante, apesar de não ser nada fácil, tanto para crianças como para adultos!
Beijos
Maravilha Marta. Educar realmente é uma tarefa árdua. A semente que se planta e só vamos colher os frutos mais tarde. Grande abraço.
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