7 de ago. de 2009

Inveja

Referindo-me a outra cidade _ menor que a minha, com menos habitantes _ em que observei índices de desenvolvimento superiores aos do meu torrão natal, atingida no amor-próprio, escrevi: “Fiquei com inveja”.

Pois, sem saber a quem dirigir a indignação, busquei conhecer melhor a cidade que mexera com os meus brios. Na internet, além dos índices promissores, conheci a sua história e a determinação e garra do seu povo.

Mais tarde, tendo chegado a algumas conclusões sobre a disparidade do desenvolvimento entre as duas cidades, ainda à procura de melhor entendimento, o termo “inveja” ficou na minha cabeça, na dúvida sobre se teria sido bem aplicado, no caso em questão. Poder-se-á considerar inveja o sentimento em que a admiração predomina? Quando tudo o que se deseja é ser igual, possuir a mesma capacidade de empreendimento, usufruir de semelhante sucesso?

Fui para o dicionário: ”Inveja é o sentimento em que se misturam o ódio e o desgosto, provocados pela felicidade, prosperidade de outrem”. Também é “o desejo irrefreável de possuir ou gozar, em caráter exclusivo, o que é possuído ou gozado por outrem”. Mais adiante, indo fundo no estômago dos invejosos, as definições extrapolavam para o mau-olhado. “Tô fora”, pensei.

Quando não se sente ódio pela pessoa, instituição ou cidade que nos desperta o sentimento de querer ser igual ou ter as mesmas condições, o desgosto é dirigido a nós mesmos _ embora não gostemos de admitir. Nesse caso, talvez o termo mais correto seja “frustração”, que é o sentimento experimentado, quando outros conseguem o que desejaríamos para nós.

O invejoso costuma agir de má fé, tentando criar situações em que o outro desça das alturas (para que fique ao seu nível). Indo além, ao mesmo tempo em que lhe puxa o tapete, pode fazer articulações ardilosas, para que as posições sejam trocadas e logo passe a ocupar o lugar desejado, o rival colocado para fora do jogo, à custa de artimanhas.

Roído pelo despeito, auto-estima lá embaixo, não consegue admitir as qualidades do outro, por isso busca justificativas para o seu sucesso, de preferência alheias ao mérito: “Também, desse jeito, até eu...”

O invejoso fica satisfeito, quando as suas maledicências são bem acolhidas. Sente-se poderoso, por um momento fugaz. Depois, _ como o ponto crucial não é o outro, e sim a infelicidade e frustração com a sua realidade e consigo mesmo _ apressa-se a procurar a pastilha contra a azia.

Quando se admira o desempenho de outra cidade, por compreender que os cidadãos de lá, de alguma forma, foram mais capazes para alcançar os resultados que desejaríamos também para nós (note-se o detalhe: também para nós), o sentimento é de frustração apenas, não de inveja. A vontade de alcançar, sem que o outro precise perder, é uma das diferenças entre inveja e frustração. Símbolo do negócio em que todos ficam satisfeitos, é o que, nas negociações, recebe o nome de “ganha-ganha”.

Quando aceitamos o sentimento experimentado como sendo frustração e conseguimos entender que o outro não tem nada a ver com isso, podemos deixá-lo lá, usufruindo do sucesso merecido, enquanto vamos batalhar para conseguir algum. E uma boa maneira é voltar ao dicionário e praticar um dos significados da palavra “espelhar”, que seria a determinação de seguir o exemplo daqueles que admiramos. Sem inveja.

Um comentário:

Ruthe disse...

Conhecer a si próprio é muito difícil. Ao ler a crônica, fiquei sabendo quem sou eu, em relação ao tema proposto. Foi uma felicidade saber que estou livre deste "Pecado Capital". Mas devo confessar que já senti inveja de algumas cidades gaúchas, onde os cidadãos as cuidam com desvêlo apaixonado, entre tantas outras coisas, de seus vasos floridos em canteiros centrais, separando as duas mãos , da via pública. Quem sabe, um dia, não sinta mais inveja!
Beijos