19 de nov. de 2011

Experimente

O cara se propôs passar 50 dias sem mentir uma única vez, nem uma vezinha sequer. Nem aquelas mentirinhas inocentes do dia-a-dia, aquelas que facilitam as situações e evitam melindres, como garantir à mãe que a lasanha está ótima, só falta um pouquinho de sal, ou a falsidade de usar o “jeitinho” para conseguir o que se quer ou fingir que se está por dentro de algum assunto, para parecer culto e antenado, quando só se leu uma notinha rápida sobre ele.

O cara era um jornalista, Felipe Van Deursen, fazendo força para produzir uma matéria inusitada para a revista Super Interessante, o que afinal conseguiu e a reportagem ficou ótima. Mas pensa que foi fácil? Pensa que é fácil ficar sem dizer o que se pensa, realmente, ainda mais quando se tem a oportunidade, por ter sido inquirido? Experimente.

Não se trata de dizer tudo o que se pensa, só de ser absolutamente sincero, ao precisar emitir alguma opinião. Bem, isso parece simples, à primeira vista. Pior seria a obrigatoriedade de expor todos os pensamentos, aí eu acho que nenhum relacionamento resistiria. Até os suspiros mentais que certas situações provocam, se externados, já seriam catastróficos. Dar respostas sinceras não parece tão difícil.
A maioria das pessoas tem dificuldade em externar a sua opinião, prefere o conforto em cima do muro, nem pra cá, nem pra lá. Já eu me sinto mais confortável sendo franca: não propriamente falando a verdade, porque a minha opinião não representa obrigatoriamente a verdade, apenas dizendo o que penso. Mas até isso, que pode parecer simples, fica às vezes difícil de gerenciar. E se o outro se sente bem como está e não quer saber de mudar? Ou se o outro sabe que está errado, mas ainda não está preparado para enfrentar a mudança? Pra quê saber o que penso?

Então, estamos acertados: nada de sair por aí emitindo opiniões, como donos da verdade. Em boquinha fechada, não entra mosca. Mas se alguém perguntasse a nossa opinião e estivéssemos proibidos de mentir? Se a amiga perguntasse “o que achas?”, metida no modelito recém comprado, aquele caríssimo, no qual ela falou a semana inteira? Seria válido exclamar “Que horror!”? Ou se o amigo, completamente apaixonado, perguntasse “Agora acertei, não é mesmo?” _ referindo-se ao desastroso relacionamento anterior _ seria fácil dizer que a atual escolhida é mais pilantra que a outra? Ou _ partindo para situações menos estressantes _ em vez de dizer que devíamos estar dormindo, quando o telefone tocou pela décima vez, poderíamos responder que tínhamos coisa mais interessante para fazer? Ou que apenas precisávamos de um momento de sossego? Se alguém perguntasse por que sumimos do clube, daria para confessar que trocamos de turma, porque aquela estava muito chata?

Decididamente, já que a idéia não é produzir uma matéria que dê o que falar, ao preço de perder amores e amizades, melhor segurar a língua. Mas continuo achando que é mais fácil conviver com pessoas sinceras, que se posicionem, mesmo quando às vezes não gostamos de ouvir. Por isso, perdoem, mas só me perguntem alguma coisa quando desejarem uma opinião sincera.

2 comentários:

Ruthe disse...

Impossível, ao menos para mim. as mentiras ditas " brancas",são necessárias, e eu tenho mil provas disto, senão ficaria isolada de vários relacionamentos, que aprecio demais entre amigos e familiares!
Beijos

Zênia disse...

Marta, é a primeira vez que me encorajo a dar opinião sobre os teus textos. Sou suspeita por amiga e colega, mas, é sempre melhor dizer a verdade: escreves de maneira tão interessante,tens tato para dizer as coisas e és verdadeira, sábia, experiente. Vais chegando ao assunto e dizendo verdades que nos satisfazem e nos acordam. CADA VEZ APRECIO MAIS TEUS TEXTOS. Talvez alguém venha a dizer mais, o que eu não cheguei a dizer. Parabéns!